Na cidade de Aarggh morava uma grande família chamada Corpo. Papai Corpo, mamãe Corpo e uma série de pequenos Corpos moravam em uma casa impressionante, construída num lote de esquina perto do centro da cidade. A família Corpo vivia nessa grande casa por gerações. Eles tinham a reputação de acolher
estranhos deixados à própria sorte. As pessoa da cidade descobriram ao longo dos anos que podiam sempre confiar na Familia Corpo para ajudá-los nas suas dificuldades.
A família Corpo podia afirmar com orgulho que havia ganhado o prêmio "Vizinho do Ano" mais vezes do que qualquer outra família da cidade - o que na verdade estava preocupando Papai Corpo numa manhã fria e chuvosa. Veja bem, por dez anos a atual família Corpo deixou de ganhar esse prêmio. Pior do que
isso, ela não estava nem entre as 25 famílias mais influentes.
- Eu não entendo o que está acontecendo -, murmurou papai Corpo para a esposa pelo interfone da casa. - Temos sido mesmos membros da família Corpo. Não foi na semana passada que colocamos aquele letreiro enorme que dizia: 'Corpo: Uma família que você deveria conhecer'? Será que ninguém mais sabe ler?
- Bem, querido - disse mamãe Corpo meigamente -, talvez as pessoas não olhem mais para letreiros. Talvez ...
- Sim, sim é claro! - gritou papai Corpo. - Precisamos nos adaptar aos novos tempos. As pessoas realmente não lêem mais cartazes. Eu sei o que vamos fazer. Está na hora de abrirmos uma página na Internet. Isso vai fazer a diferença. Mande subir o filho número três!
- Você quer dizer o Beto - corrigiu a mamãe Corpo.
- Sim, sim, isso mesmo - rosnou papai Corpo enquanto
olhava para longe.
Logo Beto Corpo pulava escada acima até o escritório executivo do pai. Bateu na porta maciça de mogno, entrou rapidamente e vociferou a saudação exigida: "Filho número três se apresentando, senhor - disse Beto.
- Fique à vontade, filho - respondeu papai Corpo -, você sabe que nós somos uma família aqui. Bem, tenho a impressão de que não estamos acompanhando o tempo. Isso não pode acontecer. Você está por dentro de computadores?
- Sim, senhor - Beto respondeu.
- Ótimo, ótimo - disse papai Corpo. - Preciso que você abra uma página na Internet. Coisa de primeira! As pessoas precisam saber por que nossa família merece receber o prêmio "Vizinho do Ano". Você acha que consegue cumprir essa tarefa?
- Pode contar comigo, senhor - Beto respondeu e fez uma pausa.
- SIM? - perguntou papai Corpo.
- Bem, senhor, gosto da idéia de termos uma página na Internet, mas ... - Beto iniciou.
- SIM? - exigiu papai Corpo.
- É que, bem, é que ... talvez devêssemos concentrar nossos esforços em algumas outras coisas que possam ter um efeito maior
- Beto continuou. - Você sabe, a senhora Ribeiro realmente não gostou muito quando colocamos aquela enorme antena parabólica; tirou-lhe a visão das montanhas. E os Batistas, da nossa rua, tinham o costume de vir e tomar uma limonada quando o tempo ficava úmido e quente; agora eles precisam marcar hora com três semanas de antecedência. E Teresa Fonseca acabou de me contar ...
- Chega! - ordenou papai Corpo. - Essas idéias eram boas e apropriadas para uma época mais simples, mas você precisa lembrar que estamos no limiar de um novo milênio! Progresso! Eficiência! É por isso que instalamos o novo sistema Intercom de 900 mhz. Isso certamente melhorou nossa comunicação. É
por isso que seus irmãos menores estão participando do seminário "Introdução para a Vida na Família Corpo" - isso os deixa automaticamente conectados. A propósito, não tenho visto a filha número quinze nos últimos dias. O que está acontecendo?
- O pager dela quebrou, senhor - respondeu Beto. - Uma
criança de 5 anos às vezes esquece que um pager não é uma bolinha.
- Bem, então inscreva-a mais uma vez no seminário "Comunicação na Família", resmungou papai Corpo. - Se você o fizer, receberá um prêmio extra. Honestamente, o que está acontecendo com essa família nos últimos tempos? Aqui nós temos o melhor equipamento, os melhores programas, os melhores seminários de treinamento, e mesmo assim eu nem mesmo consigo falar com a filha número quinze ...
- Clarice, senhor - Beto interrompeu.
- ... quando preciso. Alguma coisa precisa ser feita. Mas tenho tentado tudo. O que mais pode ser feito? Como podemos ganhar o prêmio "Vizinho do Ano" se nem mesmo consigo fazer com que a minha família aja em unidade?
Beto não disse uma palavra, embora ele achasse que soubesse a resposta. Ele havia lido os arquivos da família e descoberto que, em algum ponto, a família Corpo tinha parado de funcionar como uma família e começado a agir como uma empresa. É claro que papai Corpo jamais admitiria isso; ele falava tão insis-
tentemente que eram uma família, que não adiantaria mostrar a realidade dos fatos. Mas Beto conhecia a verdade. Ele também sabia que mais uma vez eles deixariam de ganhar o prêmio "Vizinho do Ano".
Extraído do Livro "Igreja S/A"
Glenn Wagner - Ed Vida 2003
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